QUANDO AGRADECI NO METRÔ

Confesso, eu tive medo. De longe, ainda na rua, antes de entrar na estação do metrô, avistei aquele jovem fazendo um gesto exagerado com as mãos enquanto falava com desconhecidos. Usava uma bandana amassada na cabeça e se movimentava de forma esquisita. Sua postura era levemente corcunda e percebi uma inquietação que quase não cabia dentro e por isso carregava certo tom de agressividade. É o que pareceu para mim, mas os minutos seguintes me deram a chance de olhar diferente. 

Entrei na estação, desci as escadas rolantes e desconectei daquela figura incômoda. Passei pela catraca, desci mais escadas e avistei novamente o homem conversando com uma mulher. Ele havia feito o mesmo percurso que eu, pensei. Achei curioso como a moça parecia à vontade com o desconhecido. Fiquei intrigada. 

Escolhi uma entrada de vagão distante de onde eu estava. O metrô chegou. Entrei. Sentei. E qual não foi a minha surpresa quando dou de frente com o tal, que se sentou ao lado de outra moça. Fiquei observando. Ele cumprimentava de um jeito diferente e até afetivo, embora impositor. Mas a mulher, que nessas alturas já estava em altos papos, não se intimidou. Ria, ouvia, falava... 

E eu lá, olhando a dupla e o invisível que se passava dentro de mim, enquanto as quatro estações passavam pelos trilhos do meu sentir. Aí foi demais: ele pediu para tirar um self com ela. E não é que ela tirou? Com o celular dela! Eu já estava quase querendo ir até o banco deles participar da conversa. Queria adentrar, ver o que não vi, aprender sobre transformar muros em pontes. 

Na quinta estação a mulher saiu do vagão com um sorrisão no rosto e um tchau para o moço, como se tivessem se tornado grandes amigos. Ela até tinha um registro desse momento no seu celular. Bela recordação, pensei. Nessas alturas eu já estava torcendo para que ele se sentasse do meu lado. Assim eu poderia me redimir de mim mesma. Seria uma redenção silenciosa, mas valorosa. Um reparo na casa do medo que separa e julga tudo aquilo que não consegue compreender. 

Mas ele saiu. Deixou o vagão e meus pensamentos vagando junto. Foi uma chance perdida na ação, mas não na consciência. Apesar de eu nada ter feito, algo foi feito neste encontro que não se efetivou. Quantos encontros não acontecem realmente, mas são tão reais! Que curioso. Ele existindo em mim, eu sem existência para ele. 

Agradeci por dentro, por ter conseguido ao menos alterar o meu sentir. Usar transporte público em uma cidade como São Paulo traz estes convites, de se misturar na multidão e anestesiar ou acordar. Escolhas diárias... 

Olhei mais uma vez pela janela, quase como uma despedida melancólica de abraço. Vi que o rapaz estava novamente perambulando, talvez buscando novos amigos. Torci por ele. Em seguida, li a placa: Estação Paraíso. 


Deborah Dubner acredita que praticar a Gratidão pode acontecer a qualquer hora e em qualquer lugar. Seu livro “A Prática da Gratidão”, lançado em junho deste ano, é um convite para este exercício inspirador.

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